Acolhimento familiar – o que é?
Uma família de acolhimento recebe temporariamente em casa uma ou mais crianças que precisam de um sítio onde ficar até que o seu projeto de vida se defina e concretize. Esta estadia pode ser curta ou prolongada por um período de anos, até a CPCJ ou o Tribunal decidir qual o melhor caminho para a criança. Prioritariamente, procura-se que a criança regresse para a sua família de origem. Caso não existam condições para que tal aconteça, define-se um projecto de vida alternativa que passa pelo enquadramento da criança num contexto familiar definitivo, por exemplo, através da adopção.
As famílias candidatas a adopção não podem, por lei, ser candidatas a acolhimento familiar (e vice-versa).
POR QUE É O ACOLHIMENTO IMPORTANTE?
Durante muito tempo, quando por algum motivo a família de origem não conseguia tomar conta dos seus filhos, a única resposta para estas crianças passava pela integração numa casa de acolhimento residencial, que os recebia e se encarregava deles durante o período de tempo necessário (por vezes durante vários anos). Sabe-se, contudo, que crescer numa casa de acolhimento residencial com muitas crianças e cuidadores que trabalham por turnos tem um impacto negativo na saúde das crianças.
É mais provável que uma criança em acolhimento tenha problemas de vinculação, porque quando há muitas crianças por cuidador é difícil que estas tenham a atenção de que precisam, que lhes peguem ao colo
durante muito tempo, que sejam alimentadas quando têm fome (e não à mesma hora do que todos as outras), entre outras questões. As crianças em acolhimento residencial têm mais risco de ter problemas de saúde (por exemplo, os estudos indicam que o seu batimento cardíaco é mais acelerado, que correm mais risco de desenvolver alergias, entre outras doenças) e que se desenvolvem menos rapidamente, i.e. o seu desenvolvimento emocional não corresponde ao da sua idade cronológica. (ler Criança puzzle).
A integração numa família cuidadora, com rotinas consistentes, paciente e carinhosa permite à criança criar um vínculo seguro e estabilizar a sua vida dentro da rotina familiar, pelo que é muito importante que existam famílias prontas a acolher.
PORQUÊ ACOLHER?
Acolher e adoptar não são, ou podem não ser, experiências de parentalidade muito diferentes. Para ambas é necessário ter a capacidade de fazer aquilo a que se chama “parentalidade terapêutica”, ou seja, aprender a cuidar de crianças de forma protectora, tendo em atenção o seu passado. Tanto os pais adoptivos como a família de acolhimento devem ser guardiões da criança, figuras pacientes e tranquilas, que sabem escutar em vez de disciplinar de modo autoritário (tendo, claro, a capacidade de impor os limites necessários).
A maior diferença entre a parentalidade adoptiva e de acolhimento é que nesta última o objectivo é o regresso da criança a casa dos seus pais biológicos (reunificação familiar) ou caso tal não se revele viável a sua passagem para um contexto familiar permanente, pela via da adopção ou outra que se revele mais adequada à situação da criança.
Deste modo, a família de acolhimento precisa de ter a capacidade para saber responder às necessidades da criança num momento difícil da sua vida e para trabalhar com os pais e com as equipas envolvidas no sentido de promover uma relação boa entre todos. Decidir ser família de acolhimento não é um caminho fácil, dado que implica formar laços profundos com uma criança que mais tarde regressará a casa dos seus pais ou terá um projecto de vida alternativo. Contudo, saber que se ajudou a criança no momento mais difícil da sua vida, que se teve a capacidade de ser um porto seguro, vendo-a crescer de modo tranquilo depois de um início de vida complicado, pode ser imensamente compensador.
Como acolher?
Contacte com o serviço de acolhimento familiar da sua zona de residência e inscreva-se numa sessão informativa (esta não tem carácter vinculativo). Após a frequência da sessão, reúna a documentação necessária, e apresente a sua candidatura.
Será necessário frequentar as sessões do programa de formação inicial para as famílias de acolhimento, após o qual se seguirão encontros com a equipa que irá avaliar a candidatura. No final do estudo, e caso o parecer seja positivo, fica habilitado para ser família de acolhimento.
Para saber mais sobre a candidatura ao processo de acolhimento consulte estas páginas: Segurança Social; Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Tipo de acolhimento
Em Portugal, não existe diferenciação entre tipos de acolhimento familiar. Durante o estudo da candidatura, avalia-se se a família tem disponibilidade para: 1) acolhimentos de urgência; 2) acolhimentos planeado ou 3) para acolhimentos que se imaginam ser de longa duração (aqueles em que não é possível antecipar o tempo do acolhimento no momento em que este se inicia).
Perguntas importantes
- Está disposto a viver sem a criança no dia em que esta regressar à sua família biológica ou se for encaminhada para adopção?
- Tem a capacidade para apoiar e envolver a família de origem da criança de quem está a cuidar, em vez de procurar substituir os seus pais? É muito importante que a família de acolhimento mantenha uma ligação com a família de origem da criança para o seu bem-estar.
- Imagina-se a trabalhar bem com as equipas técnicas?
- Informou-se o suficiente sobre os efeitos que o trauma e a negligência têm na criança?
- É paciente o suficiente para compreender uma criança em luto?
- Sabe que uma das consequências da separação da família de origem no comportamento da criança pode ser a projecção de sentimentos de rejeição na família de acolhimento? Seria capaz de compreender e aceitar a rejeição e o desafio, percebendo que estes fazem parte do trauma? Tem a capacidade de não levar as coisas pessoalmente?
- Consegue manter a herança cultural e contribuir para o desenvolvimento de uma identidade racial positiva na criança?
QUALIDADES DA FAMÍLIA DE ACOLHIMENTO
Em Families considering Foster Care and Adoption descrevem-se as seguintes características que podem contribuir para uma experiência bem-sucedida na adopção ou no acolhimento, como «ter tempo para dedicar à criança, ser inclusivo e ter a capacidade de incluir tradições familiares que honrem a família biológica da criança, bem como conseguir adequar expectativas».
CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS DOS PAIS ADOPTIVOS E DE ACOLHIMENTO
Flexibilidade – Aprender e usar um novo conjunto de capacidades e estratégias parentais que lhes permitem apoiar as crianças / jovens que sofreram separação e perda;
Paciência – Trabalhar no desenvolvimento de uma vinculação saudável por um longo período de tempo;
Parentalidade terapêutica – Encarar a disciplina como uma oportunidade para apoiar as crianças e os jovens na aprendizagem e no crescimento, e não como um castigo;
Empatia – Usar estratégias para transmitir compaixão e terem compaixão pelos pais biológicos e pelos desafios que estes podem enfrentar;
Adaptabilidade – Compreender a importância de se adaptarem às expectativas dos pais biológicos;
Sentido de humor – usar o humor para gerir o stress, expressar sentimentos e diminuir a tensão, rirem-se de si mesmos e não levarem tudo a sério.
Pode ser (e suspeitamos que vai ser) necessário para a família de acolhimento alterar as suas abordagens perante a paternidade, compreender e validar as identidades sobrepostas e as experiências vividas pela criança. Será útil identificar as suas práticas parentais e perceber como podem ser ajustadas para responder às necessidades emocionais, de desenvolvimento, sociais e físicas de crianças e dos jovens que sofreram separação, perda e outras formas de trauma. A família de acolhimento tem ainda de saber dar prioridade às necessidades da criança.
SABER MAIS
Ao longo do próximo ano, iremos escrevendo os textos sobre acolhimento e acrescentando as fichas de apoio que formos traduzindo. Até lá, consulte na secção Para ver os vídeos da Fundação Spaulding e leia as secções Criança real e Parentalidade terapêutica. Muitos dos conselhos que são dados às famílias adoptivas são também úteis e necessários para as famílias de acolhimento.