CRIANÇA REAL
1. Normalidade adoptiva
2. Criança puzzle
3. Vinculação
4. Negligência
5. Trauma
6. Abuso sexual
Normalidade adoptiva
As crianças que foram adoptadas não são necessariamente mais difíceis do que as outras, mas tanto um bebé adoptado à nascença, como uma criança que chegou a casa dos seus pais adoptivos aos cinco anos terão à partida de lidar com a dificuldade acrescida de precisarem de compreender e aceitar o seu passado.
Os pais adoptivos, ao contrário dos pais biológicos, têm a tarefa adicional de ajudar os seus filhos/as a aceitar o seu início de vida. Precisam, por isso, de conhecer as consequências que as experiências de trauma e de negligência podem ter no cérebro das crianças e de treinar aquilo a que se chama de parentalidade terapêutica (a capacidade de os pais contextualizarem os comportamentos difíceis das crianças e de saber responder-lhes de forma calma e paciente).
Cuidar de crianças adoptadas não é o mesmo do que tomar conta de crianças que não o são. Aprender a conhecer a criança exige tempo e paciência. Criar uma vinculação segura é um processo lento e demorado, tanto da parte dos pais como da criança, devendo estes estar preparados para lidar com as dificuldades e ser capazes de pensar a longo prazo, evitando estratégias inadequadas, como bater, gritar ou dar grandes sermões.
Muitos pais perguntam-se se as dificuldades dos seus filhos se devem, ou não, ao facto de terem sido adoptados. Veja o vídeo de Karyn Purvis, autora de The Connected Child, a este respeito.
CARACTERÍSTICAS, COMPORTAMENTOS E QUESTÕES EMOCIONAIS COMUNS NAS CRIANÇAS ADOPTADAS
• Dificuldade em lidar com mudanças, como uma transferência de escola, uma professora nova de ballet, uma mudança de casa, etc. A regra de ouro da adopção é a «estabilidade de rotinas, de pessoas e de sítios»;
• Dificuldade em lidar com a morte ou a doença de alguém próximo ou de um animal de estimação (estes acontecimentos podem fazer reaparecer comportamentos que os pais julgavam ter ajudado a ultrapassar, como birras ou pesadelos);
• Dificuldade em ler pistas sociais (alguns dos exercícios propostos no site ajudam a integrar a relação entre aquilo a que se chama os dois hemisférios do cérebro);
• Idade emocional abaixo da idade «real» (segundo Johanne Lemieux, a criança adoptada terá uma diferença de dois anos a nível emocional em relação à sua idade actual);
• Dificuldade em lidar com transições, ou seja, em passar de uma tarefa para a seguinte;
• Dificuldade para fazer as coisas numa sequência lógica ou na ordem sugerida;
• Má noção do tempo;
• Reacções de medo perante coisas simples, bem como a gritos ou por vezes a uma voz mais ríspida;
• Pesadelos ou dificuldade em adormecer sozinho/a;
• Enurese ou encoprese (sobretudo no primeiro ano depois da adopção);
• Em adolescentes ou adultos, dificuldade em pôr fim a uma relação, mesmo quando esta não é satisfatória;
• Dificuldade em tomar decisões que não sejam para agradar aqueles de quem as crianças ou os adolescentes mais gostam;
• Dificuldade em reflectir sobre vários pensamentos ou ideias ao mesmo tempo;
• Dificuldade em antecipar os resultados ou consequências das suas acções (impulsividade);
• Dificuldade em gerir a frustração e a resposta emocional, pensando racionalmente;
• Dificuldade em desviar-se das regras ou da rotina;
• Necessidade de testar os pais.
SAIBA, CONTUDO, QUE:
1. Estas características não são exclusivas de crianças adoptadas. Muitos adultos e crianças que passaram por dificuldades também as têm, mas uma criança biológica pode ter ou não estas características, enquanto a criança adoptada tê-las-á certamente.
2. 100% das crianças adoptadas vive dentro da normalidade adoptiva (que inclui os comportamentos mencionados em cima).
3. Essas características são particularmente intensas no primeiro ano após a adopção e depois têm tendência a diluir-se, podendo surgir em ocasiões marcantes ou de mudança ao longo da vida.
4. A maioria das crianças, adolescentes e adultos adoptados (cerca de 70% ou 75% dos casos) possuirá unicamente algumas das características mencionadas, como a dificuldade em lidar com mudanças ou o medo de perder pessoas que lhes são queridas).
5. As demais crianças, de 25 a 30%, terão necessidades adicionais mais ou menos exigentes (de acordo com cada caso), podendo estas ser a nível escolar, atrasos no desenvolvimento ou alguns problemas de saúde.
6. As características da normalidade adoptiva não são patologias graves, não são defeitos, nem distúrbios graves e persistentes. São características previsíveis e normais de pessoas que passaram por um conjunto de provações físicas e psicológicas na infância, antes de terem sido adoptadas por famílias que finalmente souberam responder correctamente às suas necessidades.
7. O facto de essas características da normalidade adoptiva não serem patologias graves não significa que as crianças adoptadas enfrentem os mesmos desafios do que as crianças biológicas. Optar pela adopção é escolher as ferramentas adicionais relacionadas com a normalidade adoptiva. É esse o motivo pelo qual devemos estar familiarizados com o conceito.
Fonte primária: Johanne Lemieux, La Normalité Adoptive. Montreal: Les Éditions Québec Amérique, 2013.
Fonte secundária: Ross W. Greene, The Explosive Child. NY: Harper, 2014.
FICHA DE APOIO
O Impacto da Adopção, Child Welfare Information Gateway.
RECURSOS NOUTRAS LÍNGUAS
How do I help my child?, Karyn Purvis Institute of Child Development.
La aventura de convertirse en familia, Biblioteca Pos-Adopción.
Johanne Lemieux, La Normalité Adoptive. Montreal: Les Éditions Québec Amérique, 2013.