Respirar fundo

 

«Ameaças gritos ou palmadas acrescentam medos ao medo que a criança já tem e podem funcionar a curto prazo, mas não a longo, pois não a ensinam a regular-se emocionalmente».

Aquando da chegada das crianças a casa há uma série de elementos que pode dificultar a sua adaptação. Não existem regras únicas de parentalidade, e as crianças são muito diferentes entre si, mas talvez os pais se sintam acompanhados se virem este vídeo da Spaulding Foundation. Nele, psicólogos, famílias adoptivas e de acolhimento falam sobre a importância da regulação parental.

(O seguinte vídeo, da Fundação Spaulding, ajuda a perceber melhor como podem os pais aprender a auto-regular-se. O vídeo encontra-se legendado em Português).

É natural que os pais adoptivos procurem duplicar modelos educativos tradicionais, e é natural que percam a paciência de vez em quando. No entanto, pode ajudar se souberem que as seguintes reacções podem levar situações difíceis a escalar. Se os pais procurarem manter a calma e baixar o tom de voz, em vez de o subirem, ou se se sentarem tranquilamente no chão, a criança pode começar a acalmar-se.

 

NÃO A: BATER — GRITAR — SERMÕES LONGOS — AMUAR — ENVERGONHAR

 

Tácticas educativas como bater, gritar, etc., até podem funcionar no momento ou a curto prazo, mas não resultam a longo prazo, porque não ensinam a criança a tomar boas decisões e a controlar os seus impulsos. Quando as crianças foram adoptadas estas tácticas não funcionam a longo prazo por quatro motivos adicionais:

Trazem ao de cima maus-tratos anteriores, fazendo com que a criança associe os novos pais a uma experiência negativa;

Não retiram a criança da birra. Ou seja, quando a criança está no meio de uma crise, o seu cérebro activou aquilo a que se chama modo de fuga. Neste momento, é difícil, senão mesmo impossível, fazer com que ela oiça o que lhe quer dizer. Ameaças, gritos ou palmadas acrescentam medos ao medo que a criança já tem e podem funcionar a curto prazo, mas não a longo. Ao mesmo tempo, alguns estudos verificaram que, quando se grita ou se ameaça bater, a criança pára porque dissocia, retirando-se da situação, e não porque está a aprender. Ora, o seu objectivo é o de educar a longo prazo.

Muitas crianças adoptadas sentem vergonha e acreditam que foram abandonadas ou retiradas aos pais porque fizeram algo de errado. Bater ou gritar só acentua a certeza de que a criança é má, de que não merece os seus pais e de que será abandonada de novo;

Dificultam ou atrasam o processo de vinculação por meses ou anos. Por exemplo, imagine que a criança ameaça bater-lhe e que em seguida o pai/mãe lhe levanta a mão e a ameaça ou lhe bate. Não só isto pode lembrar a criança experiências passadas como torna mais difícil aos pais afirmarem de modo simples e calmo a regra: «Não se bate»;

Está provado que, ao contrário da expressão portuguesa «uma estalada nunca fez mal a ninguém», bater tem consequências no desenvolvimento cognitivo e socio-emocional das crianças.

Manter a cabeça fria

Quando os pais começam a impor o modelo educativo que aqui sugerimos, percebem geralmente que ele tem resultados. Ainda assim, revertem com alguma frequência para modelos antigos de parentalidade (muitas vezes aqueles que replicam o modo como eles próprios foram educados, ou conselhos de amigos e família sobre como educar crianças não adoptadas ou em acolhimento). Quando regressam para estes modelos tradicionais, é dada aos pais a oportunidade de perceberem como é difícil alterarem os seus próprios padrões (o que os pode levar a ter alguma empatia pelas grandes mudanças que pedem aos seus filhos/as que sejam capazes de fazer).

Ao mesmo tempo, os pais podem perceber que agem assim porque lhes é mais fácil, e não porque resulta melhor. Como Daniel Siegel explica em O Cérebro da Criança, não são só as crianças que recorrem ao cérebro do andar de baixo quando estão cansadas ou com fome.

Uma das maiores dificuldades na parentalidade adoptiva é a capacidade de manter a cabeça fria, de ter paciência e evitar grandes explosões. Também ajuda saber que há sempre um novo dia, em que se pode fazer melhor, e que, tal como é importante saber reconhecer quando a criança está cansada, com fome, etc., também os pais têm de saber fazer a sua auto-análise e perceber quando estão exaustos ou menos pacientes.

RECURSOS NOUTRAS LÍNGUAS

Karyn Purvis, Desactivar la conducta de miedo con seguridad percibida, The Connected Child.

The Connected Parent, podcast site Creating a Family.

Emily Cuddy and Richard V. Reeves, Hitting kids: American parenting and physical punishment, Thursday, November 6, 2014.